Pages

terça-feira, 25 de maio de 2010

Gêneros - 9o.s anos



Oi, turminha!

Você sabe o que é um conto de amor?

Os contos de amor se caracterizam por enredos em que as personagens enfrentam obstáculos para realização de seu amor, já que o conflito se desenvolve em torno dos sentimentos das personagens. Esses obstáculos podem ser externos, como a oposição da família ou da sociedade, a distância, a morte, guerras, o exílio etc., ou internos como o medo do amor, a timidez etc.
O narrador de contos de amor revela a evolução desses sentimentos como causa e consequência das ações do enredo, de acordo com o foco narrativo adotado, o estado psicológico das personagens será revelado de maneira mais ou menos explícita.

Leia

Com certeza tenho amor


Moça tão resguardada por seus pais não deveria ter ido à feira. Nem foi, embora muito o desejasse. Mas porque o desejava, convenceu a ama que a acompanhava a tomar uma rua em vez de outra pra ir á igreja, e a rua que tomaram passava tão perto da feira pareciam espelhar-se nas paredes claras.
E foi nessa rua, recortada como uma silhueta em suas roupas escuras, o rosto meio coberto por véu, que o mais jovem dos saltimbancos, atrasado a caminho da feira, a viu.

Era o mais jovem era o mais forte era o mais era o mais valente entre os onze irmãos. A partir daquele encontro, porém, uma fraqueza que não conhecia deslizou para dentro do seu peito. À noite suspirava como se doente.
- Que tens? – perguntaram-lhes os irmãos.
-Não sei - respondeu. E era verdade. Sabia apenas que a moça velada aparecia nos seus sonhos, e que parecia sonhar mesmo acordado porque mesmo acordado a tinha diante dos olhos.
Àquela rua a moça não voltou mais. Mas ele a procurou em todas as outras ruas da cidade até vê-la passar, esperou diante da igreja até vê-la entrar acompanhou-a ao longe até vê-la chegar em casa.
Agora sorria, cantava, embora de repente largasse a comida no prato porque nada mais lhe passava na garganta.

- Que tens? – perguntaram-lhe os irmãos.

- Acho, não sei... – respondeu ele abaixando a cabeça sobre seu rubor – creio ... que tenho amor.
Na sua casa, a moça também sorria e cantava, largava de reprente a comida no prato e se punha a chorar.
Tenho... sim... com certeza tenho amor – respondeu à ama que lhe perguntou o que tinha.
Mas nem a ama se alegrou, nem se alegraram os dez irmãos. Pois como alegrar-se com um amor que não podia ser?
De fato, tanto riso, tanto choro acabaram chamando atenção do pai da moça que, vigilante e sem perguntar, trancou-a no quarto mais alto da sua alta casa. Não era com um saltimbanco que havia de casar a filha criada com tanto esmero.

Mas era com um saltimbanco que ela queria casar.
E o saltimbanco, ajudado por seus dez irmãos, começou a se preparar para chegar até ela.

Afinal uma noite, lua nenhuma que os denunciasse, encaminharam-se os onze para a casa da moça. Seus pés calçados de feltro calavam-se sobre as pedras.
O mais jovem era o mais forte, teria ele que sustentar os demais. Pernas abertas e firmes, cravou-se no chão bem debaixo da janela dela. O segundo irmão subiu para os seus ombros, estendeu a mão e o terceiro subiu. O quarto escalou os outros até subir nos ombros do terceiro, E um pó cima do outro, forma se construindo como uma torre. Até que o último chegou ao topo.
O último chegou ao topo, e o topo não chegou à altura da janela da moça. De cima a baixo os irmãos passaram-se a palavra. Os onze parecem ondejar por um instante. Então o mais jovem e mais forte saiu de debaixo dos pés do seu irmão deixando-o suspenso no ar, e tomando a mão que este lhe estendeu subiu rapidamente por ele, galgando seus irmãos um a um.

No alto, a janela se abriu.
(Marina Colasanti. 23 histórias de um viajante. São Paulo: Global, 2005 p.51-55.)
Depois desse encantamento, é possível analisar que o conto, embora uma narrativa curta, é extremamente denso porque desvenda as almas das personagens principais: a moça e o saltimbanco. Através do narrador onisciente é permitido conhecer as sensações e angústias vividas pelas personagens. E a descoberta da correspondência desse amor nos permite acreditar nele, além de torná-lo capaz de resistir à diferença social que se fez obstáculo ao amor das personagens.

Perceba que há no conto elementos que o aproximam dos contos de fada, também que o elemento mágico no final da narrativa é uma característica dos contos maravilhosos: a torre humana permanece no ar, ou seja, por amor há uma intervenção mágica, mas não total, pois é necessário que a personagem escale para chegar à amada, o que nos remete à realidade.

4 comentários: